domingo, 22 de março de 2015

23. Juliana e mais uma solução

Criei este blog para compartilhar minha experiência com outras pessoas, deu tudo tão certo comigo que outros precisavam saber que existem soluções para muitos casos de hidrocefalia.

Pois então, dentre as várias pessoas que leram o blog e entraram em contato comigo, uma foi a Juliana. O bom é que ela também encontrou uma solução para o problema dela, uma ótima solução. Vejam nossa troca de e-mails.


Boa noite, Fernando,

Peguei seu contato no seu blog "Cabeça líquida". 

Estou em uma situação bastante parecida com a que vc passou. A diferença é que minha má formação de Chiari é "falsa", pois é causada pelo deslocamento que um cisto que tenho no tronco encefálico produz no cerebelo. 

O fato é que minhas tonsilas cerebelares estão projetadas para dentro da coluna e isso está gerando uma obstrução (ainda parcial) do fluxo liquórico. 

Há um ano mais ou menos comecei a ter problemas de controle motor e agora, nos últimos meses, piorei muito e estou com hidrocefalia (discreta) e aumento do III ventrículo e ventrículos laterais. Tenho muita tontura e dor de cabeça, mal consigo andar em linha reta. Um horror!

Bem, certamente vou ter que operar... Não sei ainda qual será o tipo de cirurgia. Estou em São Paulo, capital, e queria MUITO saber o nome do médico que vc operou e em qual hospital foi. 

Estou certa de que quero fazer a cirurgia mas estou insegura qto ao profissional. Como vc fez a ventriculostomia e eu acho que ela pode funcionar no meu caso, seria bom ter o contato do seu médico.

Muito obrigada pela atenção e desculpe a invasão de privacidade...

Abs, Juliana

Olá, Juliana.

Que bom receber seu contato. Acredite, sei exatamente o que você está passando agora.

Meu médico certamente pode avaliar seu caso. Ele é muito competente, honesto e se coloca no lugar do paciente. Veja os dados (aqui passei os dados a ela).

Se você quiser continuar trocando ideias comigo, fique à vontade. Sei que neste momento conversar com alguém que entenda o problema é muito bom.

Um abraço grande, Fernando

Olá, Fernando,

Recebi seu e-mail e liguei no seu médico para agendar consulta mas ele não atende meu convênio... :(

Vc operou com ele, né? Foi no hospital 9 de julho?

Eu passei com o Dr. Guilherme, por indicação de um amigo. Ele tb não atende meu convênio, mas agora está acompanhando meu caso e está com meus exames. Provavelmente voltarei nele... Mas acho que não irei operar com ele pq não vou poder pagar...

Enfim... 

Faço acompanhamento do meu cisto desde 1998 com o Dr. Antônio Carlos, do hospital Beneficência Portuguesa. Vc conhece alguém que tenha operado lá?

Marquei consulta tb com o Dr. Milton, já ouviu falar? Não sei se ele é bom...

Bem, por enquanto é isso. Estou aqui na mesma, esperando passar esta semana, pois irei defender minha tese de doutorado na sexta... (vou ter que encarar assim mesmo... afff...).

Vamos mantendo contato! Obrigada novamente pela atenção e gentileza.

Abs, Juliana

Juliana,

Que bom ter sua resposta.

Não conheço nenhum destes médicos, o que nada quer dizer (rs). Eles podem ser muito bons. 

Meu médico, o Dr. Marcelo, tem um sistema muito bom de valores de consulta. Se o consultório dele não trabalhar com o plano do paciente, o valor da consulta é reduzido o mais próximo possível do reembolso pago pelo plano. Por exemplo, em meu caso a consulta foi reduzida para R$ 120,00, valor próximo aos R$ 65,00 que a Amil paga. Esta seria uma boa opção para você? Talvez fosse muito interessante conhecer a opinião do Dr. Marcelo sobre seu cisto.

O problema, e concordo com você, é a cirurgia. Neste caso tive que pagar de meu próprio bolso. Meu plano até reembolsou, mas foi algo em torno de uns R$ 200,00 – bem longe dos R$ 9.000,00 que paguei pela cirurgia. Foi no Hospital Santa Joana.

Sou professor, lembro muito bem de minhas aulas dias antes da cirurgia. Não foi muito fácil, talvez um pouco parecido com a tese que você vai defender agora.

Bom, como você disse – e eu concordo plenamente – vamos continuando a conversa.

Um abraço grande, Fernando

Oi, Fernando,

Pois é... vai ser difícil, mas vou conseguir! :) Somos fortes, né?

Eu vou ligar novamente no consultório do dr. Marcelo pois é sempre bom ter uma indicação de médico, ainda mais neste caso complicado...Meu convênio não faz reembolso mas vou ver se o dr. Marcelo pode me dar um desconto... (120,00 seria tranquilo). 

Seria muito bom conversar com ele, pois não entendo como um problema de Chiari pode ser corrigido só com a ventriculostomia... (a obstrução no fluxo não continua presente?). Li no seu blog que existem complicações associadas com a descompressão da fossa posterior mas até agora só li coisas positivas sobre esta cirurgia (que é super simples e tal...)... Vc pode me indicar alguma leitura mais completa sobre o assunto?

Outra dúvida: estes 9000,00 que vc pagou foi para a equipe de cirurgia mas o convênio arcou com as despesas do hospital, é isso?

Desculpe incomodá-lo com esta avalanche de perguntas. 

Muito obrigada pela atenção e gde abraço! Juliana

Juliana,

Pode enviar tantos e-mails quantos você quiser, faço questão de continuar nossa conversa.

Sabe que eu nem lembrava o que havia escrito sobre Chiari? (rs) Fui ao blog procurar! Em meu caso, embora eu tenha a malformação de Arnold Chiari, não era esse o motivo de minha hidrocefalia. Meu problema era o líquor não passar pelo aqueduto de Sylvius, que liga o terceiro ao quarto ventrículo. A terceiro ventriculostomia criou uma espécie de canal alternativo, é por aí que circula meu líquor agora.

Em seu caso, o problema parece mesmo ser a malformação de Chiari, também não consigo entender como uma ventriculostomia ajudaria neste caso.

Não tenho uma indicação de leitura para fazer, lembro apenas de uma pessoa que me procurou por causa do blog justamente porque a descompressão dela não funcionou. Não sei se foi mal feita ou se realmente não foi o procedimento indicado. Ela ficou com um problema de sustentação por causa da craniectomia. Não sei se o Dr. Marcelo irá lembrar, ou se tem os registros da consulta – acredito que sim – mas ela marcou uma consulta com ele também. É a Elcy e posso colocar vocês em contato, se você quiser. 

Você está certa, os R$ 9.000,00 foram para o Dr. Marcelo e sua equipe, as demais despesas hospitalares foram cobertas pelo plano de saúde. O melhor é que o próprio consultório do Dr. Marcelo cuidou de toda a burocracia, desde a internação até a liberação junto ao plano de saúde.

Quando você quiser, pode enviar novo e-mail. Ah, boa defesa de tese nesta 6ª. Feira.

Um abraço grande, Fernando

Olá, Fernando! 

Minha defesa foi ótima, consegui tirar forças nem sei de onde e foi tudo muito bem, para minha surpresa! :D

De lá pra cá não procurei muitos mais médicos. Fui no meu (que me acompanha desde 1997) e no dr. Guilherme, que havia te falado da outra vez. 

Eles me explicaram que a causa da minha hidrocefalia é meu cisto mesmo, e que devo tentar a remoção dele (ao menos parcial). Como o dr. Guilherme é especialista em tumor intracraniano, vou fazer com ele, tb particular. A cirurgia é beeeeeeeeeem cara, mas consegui a grana emprestada... (ufa!).

Farei tb a descompressão por conta do Chiari.

A cirurgia tá marcada para dia 05! Desde minha defesa tenho lido e estudado muito sobre tudo isso e agora quero apenas que tudo passe logo!

Torça por mim! 

Obrigada pela ajuda e mando notícias assim que possível.

Abs, Juliana 


Torcerei por você, certamente. Dizem que coincidências não existem, mas eu particularmente gostei da data de sua cirurgia: 5/março é dia de meu aniversário. Sempre foi uma data feliz para mim, certamente será para você também.

Por favor, dê notícias tão logo você consiga. Estarei aqui na maior expectativa.

Vai dar tudo certo, pode acreditar.

Um beijo grande, Fernando

Olá, Fernando! Como vai?

Antes de mais nada, a boa notícia: eu estou óóóóótima!!!! :))))))))))))))

Desde a última vez que falei com vc, muita coisa aconteceu... resumidamente, encontrei na internet uma menina de Santa Catarina que removeu um cisto como o que eu tinha com um médico em Curitiba. Mesmo com a cirurgia marcada, decidi ir até Curitiba, uma semana antes, só para passar em consulta... 

A consulta foi tão maravilhosa, o dr. Ricardo é tão humano e me passou tanta segurança que fiquei por lá mesmo e fiz a cirurgia já no mesmo dia 05! Ele conseguiu remover todo o meu cisto, sem afetar nenhum nervo! Para tratar a hidrocefalia, ele fez tb a terceiro ventriculostomia. Foi tudo muito fantástico, até os olhos dele brilhavam, tamanha a perfeição da cirurgia! Meu convênio, inclusive, pagou todo o procedimento! 

Eu não conhecia lá, mas é muito bom a gente divulgar. É o Instituto de Neurologia de Curitiba, tem equipamentos de ponta, e o  dr. Ricardo é muito bem conceituado! Já foi diretor em hospital na Alemanha, tem uma equipe excelente, que faz 4 cirurgias por dia, enfim... vale a pena a divulgação, pq sempre tem alguém em busca de um bom profissional, né? Eu vi gente do país todo se tratando lá e bastante gringo tb. 

Estas são as excelentes boas novas!

Agora tenho duas datas de aniversário! hahahaha (aliás, parabéns atrasado!)

Obrigada pelas boas vibrações e por toda a ajuda!

Abs, Juliana 


Nossa, que boa notícia. Nem preciso dizer o quanto fiquei contente, porque realmente fiquei muito, mas muito mesmo!

Sabe, tudo é resultado também de seu empenho e vontade. Você não ficou quieta, lamentando o que aconteceu, você foi atrás de soluções. E que solução, hein?!? Este Dr. Ricardo e o Instituto de Neurologia de Curitiba parecem excelentes. Além de tudo, você conseguiu usar seu plano. Quer dizer, tudo de bom!

Tenho então duas perguntas:

1.       Qual é seu plano? Fiquei curioso, vai que eu dia eu precise de algo, pode ser uma boa alternativa. Meu médico é excelente, mas não trabalha com meu plano.

2.       Posso atualizar meu blog contando este seu caso? Minha ideia nem é colocar o nome completo do Dr. Ricardo, mas chamá-lo apenas de Dr. Ricardo, já que não temos autorização dele. Ah, se você achar possível, gostaria de colocar o nome completo do Instituto.

Mais uma vez, estou muito contente!

Um abraço grande, Fernando

Oi, Fernando!

Pode sim divulgar a história no seu blog! É importante que outras pessoas possam ter acesso a este hospital!

Meu convênio é Cassi, mas vi no site do INC que eles atendem vários convênios, inclusive o seu, que é Amil, né? 

Eu não sei se teria problema divulgar o nome completo do dr. Ricardo, teria?

Bem, obrigada pela empolgação! :) Estou muito feliz com tudo!!!

Um abração, Juliana 

sábado, 22 de setembro de 2012

22. Depois da ressonância

Olha só, dá para ver até os detalhes!

Estas foram algumas das primeiras palavras de meu médico quando olhou a ressonância. A pressão no cérebro havia diminuído muito, dava para ver detalhes do crânio que antes não apareciam. A ventriculostomia estava funcionando! Eu já sentia isso, agora a ressonância confirmava oficialmente!

Minha vida mudou muito! Tudo estava ficando cada vez melhor! Ainda bem que não desanimei! Ainda bem que fui pesquisar o que significava minha hidrocefalia. Ainda bem que encontrei um médico competente, conhecedor das novas tecnologias, que conhecia a ventriculostomia. Ainda bem que não acreditei nos vários outros neurocirurgiões que consultei! Ainda bem que ouvi meu coração!

Fiquei tão contente com tudo o que estava acontecendo que queria compartilhar meu sucesso. Mais, queria ajudar outras pessoas que estavam passando pela mesma situação que eu havia passado. Este blog foi um dos primeiros caminhos que encontrei. Tomara que eu encontre mais, quero ajudar quem está precisando!

O blog já começou a dar resultados. Se você olhar no alto desta página, bem no canto direito, verá o link A luta de outras pessoas, em que pretendo contar casos de pessoas que entraram em contato comigo. Por enquanto há apenas uma pessoa que conheci - via internet - com um problema excesso de líquor no cérebro. Ainda não a conheço pessoalmente, tomara que algum dia eu a encontre.

Fique à vontade para compartilhar sua história aqui, muitas outras pessoas poderão aproveitar suas experiências.

Encerro por enquanto minha história com este artigo. Estou tão bem, mas tão bem, que não me canso de fazer tudo que sempre tive vontade de fazer e  não estava conseguindo mais.

Tanto é assim que voltei a uma das atividades que mais gostava, andar de bicicleta. E não é que há algum tempo, em plena manhã ensolorada de domingo, estava andando de bicicleta quando a roda da frente ficou presa em um buraco e eu ... CAÍ!

Pois é, caí e quebre o cotovelo em seis pedaços. Dá para acreditar? Fui direto para o pronto-socorro, dali para um quarto de hospital, depois para uma cirurgia - DE NOVO - colocar uma placa e vários parafuros no braço!


Cotovelo quebrado em seis lugares! Duas placas e oito parafusos implantados!
 Coisas de quem vive bem a vida. Acidentes acontecem! Estou agora justamente vivendo a fase de consolidação de meu braço - mais especificamente - do cotovelo. São três a quatro meses sem dirigir um carro. E vai saber quanto tempo sem andar de bicicleta!

Quer saber? Estou é muito feliz! Mesmo com o cotovelo querbrado. Muito melhor ter um acidente vivendo bem a vida do que trancado em casa sofrendo uma hidrocefalia mal resolvida.

Obrigado a todos que leram meus artigos até aqui. Um abraço grande!

sábado, 15 de setembro de 2012

21. Antes da ressonância

Algumas pessoas mais velhas dizem que os médicos antigamente entendiam melhor os pacientes. Eles não precisavam de exames em laboratórios, só pela conversa no consultório e pelos exames feitos ali mesmo, todo bom médico sabia tratar uma pessoa doente.

Pois então, eu precisava fazer a tão esperada ressonância para saber o que estava acontecendo com meu cérebro. Porém, desta vez fui ao laboratório com um outro estado de espírito. Eu parecia até aqueles médicos de antigamente, sabia que algo de bom havia acontecido. Eu estava sentindo isso.

Antes do exame, já havia retomado algumas de minhas atividades normais. Havia retomado minhas aulas - sou professor, voltei para minhas aulas de dança - mas aqui como aluno, estava visitando clientes e até passei uma tarde comprando equipamentos e acessórios necessários para meu computador e minhas aulas.

Preciso comemorar uma conquista aqui: as aulas de dança. Minhas colegas estavam elogiando meu estilo, minha segurança. Havia parado as aulas por três meses, mas voltei muito melhor. Claro, voltei sem o excesso de líquor em meu cérebro. Que sensação boa!


Eu e minha mulher dançando!

No dia marcado para o exame, talvez eu fosse a pessoa mais feliz naquele laboratório. Eu estava lá para comprovar o sucesso de minha cirurgia, a terceiro ventriculostomia. Foi com muita alegria que preenchi a ficha justificando o exame:

Acompanhamento de cirurgia no terceiro ventrículo.

Durante o exame, eu estava tão tranquilo e feliz que cheguei a - acreditem - dormir. Aquele barulho alto, que incomoda muita gente, estava embalando meu sono. Cheguei a confundir - em meu sonho - os sons do aparelho de ressonância com a buzina de um navio. Sonhei que estava partindo em um cruzeiro!

O exame ficaria pronto em uma semana. Que demora, gostaria de ver o resultado ali mesmo. Mas, tudo bem, eu aguardaria. Neste meio tempo, tive mais aulas para ministrar, mais clientes para visitar.

Interessante é que até a cicatrização em minha cabeça estava acelerada. Não havia praticamente sinal algum da cirurgia. Só as pessoas que sabiam dela é que conseguiam enxergar algum sinal do corte. E olha que sou careca, a cicatriz deveria ser muito visível. Mas não, ninguém via!

Não comentei, mas antes mesmo da ressonância, fui convidado por uma amiga para um passeio em Paraty. Claro que fui, havia muita vida para viver. Quem já foi a um passeio típico lá sabe que quase todos fazem um passeio de escuna. Um dia inteiro no mar!

A escuna para em alguns pontos, as pessoas mergulham, é tudo uma festa. Na primeira parada fiquei olhando todo mundo mergulhar, estava com medo de tentar. Mas na segunda não tive dúvida, pulei de corpo e alma no mar. Dá para acreditar? Havia saído há pouco de uma cirurgia! Ainda há pouco eu estava com problemas para caminhar! Imaginem, agora eu havia MERGULHADO NO MAR! É uma sensação inacreditável!

Já estava chegando o dia marcado para pegar a ressonância. Eu estava ao mesmo tempo MUITO ANSIOSO - queria comprovar os bons resultados - e CALMO, sabia que tudo estava certo...




domingo, 2 de setembro de 2012

20. E aí, funcionou?

Os dias foram passando, a cicatrização foi acontecendo, a tontura foi diminuindo, a segurança foi chegando. E, O MELHOR DE TUDO, comecei a andar normalmente. Como é bom andar direito!

Meu caminhar havia voltado ao normal. Mais do que o normal, porque eu havia esquecido o que era ser normal. Os sintomas de minha hidrocefalia foram se manifestando aos poucos, eu não percebia a degradação de movimentos e sensações.

Meu normal foi mudando lentamente e eu não percebia. Agora, estava voltando a um estágio que não lembrava mais. Não lembrava mais que ser normal era assim.

Experimentar livremente meus movimentos, caminhar ao ar livre, demorou um pouco. Meu médico havia recomendado que eu ficasse quieto em casa até tirar os pontos. Eu precisava segurar minha ansiedade, ter calma e esperar a recuperação.

Como foi difícil a recuperação. Aqueles pesadelos noturnos ainda aconteciam. Estavam diminuindo, à custa de calmante, mas estavam diminuindo. Sorte é que intuí um jeito de não precisar mais dos calmantes.

Todo dia, antes de dormir, procurava ver algo leve na TV. Alguma coisa que relaxasse, que me fizesse rir. Vi "Escolinha do Prof. Raimundo" no Canal Viva praticamente todas as noites. Acho que aquele pessoal não fazia ideia de que um programa como aquele pudesse ser tão terapeutico, tão calmante!

E o salário, ó!
 Estava chegando o dia em que tiraria os pontos. Meu cunhado, o mesmo que me trouxe para casa após a cirurgia, estava mais uma vez presente em minha vida, foi ele quem me levou para a consulta.

Como sofremos naquele dia. O trânsito estava caótico. A consulta estava marcada para as 19h, saímos de casa às 17h30, mas só chegamos perto das 20h. Que agonia!

Eu não queria perder a consulta. Tirar os pontos tinha um significado psicólogico especial. Tirar os pontos seria como tirar um dos últimos sinais visíveis externos da hidrocefalia. Está certo, eu deveria ficar com a cicatriz, cicatriz bem visível (sou careca!), mas nem pensava nisso. Eu só queria tirar os pontos!

Naquela noite, naquele carro que não chegava nunca, a sensação de pesadelo voltava, mas agora acordado. Tinha uma sensação de escuridão, medo de me perder na cidade, medo de não chegar onde queria. Meu cunhado e minha mulher conversavam animadamente, mas eu estava angustiado. Não contei para eles, preferi deixá-los tranquilos. Eu queria mesmo é chegar e tirar os pontos.

Sorte é que outras pessoas também se atrasaram nas consultas daquele dia, meu médico ainda estava lá. Tirou os pontos. Elogiou o resultado. Fez mais testes comigo. Estava tudo certo, muito certo. Que conquista!

Voltamos para casa. Que alívio. Queria muito abraçar forte minha mulher. Queria muito abraçar forte meu cunhado, eu queria muito agradecê-los. Eu estava começando a viver novamente.

Minha vida foi voltando ao normal, havia muito a reconquistar. E havia também uma nova ressonância a fazer, o que será que o exame iria mostrar?


domingo, 26 de agosto de 2012

19. Um dia em casa

Acordar no hospital foi um alívio. Primeiro, porque aquele pesadelo recorrente "não posso esquecer o caminho" (veja no artigo Uma noite no hospital) foi angustiante, estar acordado acabava com o pesadelo. Segundo, acordar depois da cirurgia, fora da UTI, com minha mulher ao lado, era muito, muito bom!

Acordei bem, tomei o café - delicioso - e o médico chegou. Mais uma vez, excelente profissional que é, fez mais alguns testes (olhe aqui, caminhe até lá, ande em linha reta) e me liberou: você pode voltar para casa!

Que sensação boa foi ouvir esta frase! Mas também estava com medo, o que estava acontecendo? Quem sabe era o pesadelo daquela noite? Comentei com o médico, ele achou que tudo poderia ser ansiedade, até sugeriu um calmante.

Não gosto de calmantes, mas resolvi aceitar. Até porque era um calmante natural, desses vendidos sem receitas, mas que para mim certamente faria um grande efeito - eu nunca havia tomado calmante antes!

Fomos para casa, meus cunhados estavam esperando no hospital e me levaram. É muito bom poder contar com família, o conforto emocional é enorme nestas horas. Mas eu estava aliviado e angustiado!

Chegando perto de casa, a angústia falou mais alto, pedi a meu cunhado para entrar direto na garagem do prédio. Eu não estava disposto a passar pela portaria e falar sobre minha cirurgia com porteiros e eventuais vizinhos que encontrasse.

Em casa, fui direto para o sofá. Tinha medo de andar. Tinha medo de cair. Eu ainda estava tonto, inseguro. Nas poucas vezes que levantei para ir ao banheiro, eu calculava com muita precisão a distância entre o sofá e a parede, era meu ponto de apoio. Como eu estava inseguro!

Chegaram as primeiras visitas, eram meu irmão e filhos. Gosto muito deles, gostei muito da visita. Foi muito bom abraçá-los e falar sobre o sucesso da cirurgia. Eles estavam todos muito preocupados, estavam agora aliviados.

E aí veio uma sensação que meu surpreendeu. Surpreendeu muito! Sou normalmente uma pessoa otimista, pronto para a vida. No entanto, na televisão ligada, alguém matou alguém, eu pensei: "Que feliz este aí, bem queria eu morrer agora!"

Duelo na TV

Que absurdo pensar assim! Tenho vergonha até de falar sobre isso aqui no blog, este tipo de pensamento não combina comigo. Como assim, "quero morrer?" Seria depressão pós-cirurgica? Seria medo daquele pesadelo que poderia acontecer novamente naquela noite? Ou estaria eu apenas cansado?

O pessoal foi embora, era hora do banho. O primeiro após a cirurgia! Era preciso muita coragem, minha mulher tirou o curativo, eu precisava lavar tudo com água e sabão. E não era só passar a mão de leve, meu médico havia dito para eu fazer uma boa limpeza, senão iria ter algum tipo de acúmulo de gordura no local - o que não seria bom.

Banho tomado, cabeça absolutamente limpa e seca, comi alguma coisa leve e já era hora de ir para a cama. Sou resistente, já disse, resolvi tentar dormir sem tomar calmantes. Claro, não adiantou, algum tempo depois de sono, lá estava eu desesperado, o pesadelo havia voltado.

Não havia alternativa, tomei o calmante, voltei a dormir. E dormi a noite toda. Será que minha vida voltaria ao normal?





sábado, 18 de agosto de 2012

18. Uma noite no hospital

Após um dia de UTI, a noite em um quarto do hospital prometia ser muito boa. Comentei em outro artigo, hospitais hoje em dia parecem até hotéis, não é a toa que encontrei frigobar, TV, serviço de quarto e até mimos como touca de banho, sabonetinhos, pentes e pastas de dentes. Um belo de um local para passar a noite.

Logo após um merecido banho - com muito cuidado, não queria molhar o curativo em minha cabeça - o jantar chegou. Jantar igualmente merecido, minha fome era muita.

Se tem algo que conforta é saber que parentes e amigos se importam com a gente. Enquanto tomava meu banho, enquato jantava, as pessoas ligavam, queriam me ver. Foi só acabar o jantar que chegaram amigos, depois parentes, depois amigos e parentes - meu quarto parecia uma festa. Meu quarto ERA UMA FESTA, estávamos todos comemorando.

Mas um problema, problema sério, estava para acontecer. Todos foram embora, ficamos minha mulher e eu. Era hora de dormir. Foi só fechar os olhos que o drama começou: EU ESTAVA COM MEDO DE DORMIR! Na verdade, eu estava mesmo é com MEDO DE NÃO ACORDAR SE DORMISSE!

Deitado, no escuro, aquele quarto parecia minúsculo, eu estava me sentindo sufocado. Minha sensação era de que não conseguiria nem me mexer na cama, de tão pequeno que sentia o quarto. Claro que era só sensação, acábavamos de receber seis pessoas ao mesmo tempo algum tempo antes.

Pior mesmo era fechar os olhos e tentar dormir. Eu tinha pesadelo, sempre o mesmo. Caminhava por um caminho bem difícil, específico, importante. Aí, quando eu acordava, o sonho ainda estava comigo, eu não poderia esquecer o caminho feito enquanto dormia porque senão não saberia voltar. Era angustiante!
Foto meramente ilustrativa publicada originalmente em Blog Olhares

Acredito que por trás de tudo isso estava o medo de perder a consciência, afinal havia um furo em meu cérebro - dois furos - o que será que aconteceria dali para frente? E se os neurologistas conservadores tivessem razão, e se meu cérebro sofresse uma inversão (artigo Cérebro Invertido)? E se o líquor não parasse mais de sair, tal como em um cano furado - como falou outro médico especialista (veja no mesmo artigo Cérebro Invertido)?

Motivos para medos é que não faltavam! Era começar a dormir que o mesmo pesadelo acontecia. Eu não podia esquecer o caminho, eu precisava voltar. Foi angustiante! Passei grande parte do início do sono dormindo, acordando, sentando na cama, de novo dormindo, acordando...

Resolvi me entregar, pensei que mais hora menos hora eu pegaria no sono. Se não encontrasse mais o caminho, se perdesse a consciência, a razão, fazer o quê? Lembrei de uns princípios de meditação, comecei a prestar atenção em minha respiração ... e dormi!

Foi um alívio! Amanheci melhor, ainda com os medos presentes, mas um pouco mais distantes. Quando o médico chegasse, conversaríamos melhor. Mas alguns problemas ainda me esperavam. Conto no próximo artigo!

sábado, 11 de agosto de 2012

17. Um dia na UTI

Você consegue mexer a perna?
Você consegue mexer o braço?
Você está me vendo?

Minha mulher leu o artigo passado, quando comentei minhas primeiras palavras, "...Não se preocupe, lembro que você também sentiu um frio grande..." e perguntou se eu lembrava das palavras dela. Não lembrava. Na verdade, não lembro até hoje. Foram estas três perguntas que iniciam este artigo.

Três perguntas, aliás, que demostram muito bem o que todos estavam pensando ANTES da cirurgia. Será que eu teria alguma sequela? Depois de todo o TERRORISMO que os médicos especialistas fizeram, motivos é que não faltavam para nossos medos.

Um falou que meu cérebro sofreria uma inversão, já que o furo na base do terceiro ventrículo o esvaziaria, e o quarto ventrículo tenderia a ocupar este espaço, provocando a tal inversão do fluxo de líquor.

Outro falou que um furo assim seria semelhante a furar um cano d'água, o líquido não pararia de sair, sairia bastante na verdade. Este médico falou inclusive que já havia vistos médicos (estes moleques formados em faculdades de segunda) fazerem isso, e que depois levavam os pacientes para ele resolver as bobagens feitas. Palavras dele, não minhas!

Mas eu acordei muito bem. Animado, otimista, querendo abraçar o mundo, como já comentei no artigo passado. E com uma fome danada, queria tomar meu café, que nunca chegava. Fiquei então ouvindo tudo o que acontecia do lado de fora do quarto, queria saber se o café estava chegando.

Ouvi então um enfermeiro mais brincalhão lá fora, ele conversava com todos, brincava com todos. Foi ele quem agilizou meu café. Talvez um dos melhores que já tomei na vida. Mesmo simples, parecia um banquete.

Ele também me levou para fazer uma tomografia, era o exame que iria apontar algum eventual sangramento. Ele foi brincando com todo mundo nos corredores, o clima era ótimo. Melhor ainda a volta: eu tinha PASSADO no exame de tomografia, não havia sangramentos!

Algum tempo mais, já fora da cama, mas ainda sem ter colocado o pé no chão, e depois de muito desenho do Pica-Pau, chegou a fisioterapeuta. Seu objetivo: testar meu equilíbrio e movimento. De novo, passei com louvor no exame.

Chegou meu médico, ainda comemorando o sucesso da cirurgia. Conversamos um pouco, fez algumas perguntas, contei sobre meu estado de espírito altamente animado, ele fez alguns testes - ande em linha reta, ponha o dedo na ponta do nariz, feche os olhos - e por fim comemorou comigo: ESTÁ TUDO MUITO BEM!

Vinha agora a melhor parte, já estava pronto para sair da UTI e ir para o quarto. Foi aí que começou o martírio, não havia quarto disponível no hospital, era preciso aguardar.

Chegou minha mulher e meu pai para a visita da tarde. Como eles estavam com minhas roupas, aproveitei e vesti calça e camiseta. Tomei uma bela de uma bronca.

Na UTI é preciso ficar de camisola!

Coloquei de novo aquela camisola. Aquela horrível camisola. Mas eu estava bem, a cirurgia tinha dado certo, eu estava de bom humor. Só estava era ansioso para sair de lá.

Comecei a passear pela UTI, procurando saber quando eu poderia sair. Tomei uma bela de uma bronca.

Há muitos pacientes por aqui com doenças graves, contagiosas, o senhor quer correr o risco?

Voltei para meu quarto, quase correndo. Afinal, havia muito Pica-Pau na TV. Depois de mais algumas horas, e da ajuda de meu amigo enfermeiro, conseguimos um quarto.

Mas a noite que se aproximava não seria assim tão tranquila. Conto no próximo artigo.